Até que data podemos desejar um bom ano?
Esta intrigante questão tem sido colocada ao longo dos anos pelos maiores pensadores sem que se consiga chegar a uma conclusão.
Desde 2013 que a minha resposta passou a ser “até ao Trilho dos Abutres”.
Era nessa icástica prova que a minha “época” se iniciava. Entre descidas vertiginosas, lama bem acima do joelho, ribeiros e cascatas onde a água corria gelada e os pés se restabeleciam, arrenegava a hora em que me tinha inscrito e todas aquelas em que me tinha baldado aos treinos.
Quando o calçado era finalmente atirado para dentro de um saco, ainda coberto da lama que a água do chuveiro não havia conseguido limpar, sentia que estava de regresso, que o meu ano se estava a caboucar.
Foi assim até 2017. A dureza da prova era o maior aliciante para nos voltarmos a inscrever. No final, entre bifanas e cervejas, contávamos as peripécias vivenciadas e brindávamos a termos ultrapassado o desafio, brindávamos muito.
Nos dias que se seguiam, apesar dos arranhões, dedos sem unhas, dores um pouco por todo o corpo, as fotos eram exibidas e partilhadas com orgulho.
Desde esse ano que não participava nos “Abutres” e neste regresso as sensações foram diferentes.
Trilhos espaçosos, tempo primaveril, as travessias dos cursos de água feitas em pequenas pontes em madeira, alteração do traçado, o que impediu a passagem pelo melhor dos “abastecimentos” em Espinho (ali chegaram-me a ir buscar um copo de vinho).
Estes Abutres em modo passeio na serra, onde a lama somente se fez notar na zona das levadas que antecede a entrada em Miranda do Corvo, pareceram tão distantes daqueles onde bolas de granizo nos deixaram marcas um pouco pelo corpo todo, ou as descidas eram ultrapassadas com o rabo a deslizar pela lama, que duvidei estar na mesma prova. Até as fotos, muitas delas tiradas mecanicamente, por câmaras estrategicamente colocadas, passaram a ser pagas!
Só as &%$#! das pedras, com a altura de 3 degraus, se mantiveram inalteradas!
Estava tudo bem organizado, o traçado estava limpo, o pequeno bar no final da prova estava tranquilo e com pouca gente. As roupas ainda exibiam os seus símbolos e os dentes continuavam brancos.
O momento era tão zen, que o meu abutre pensou que era verdadeiro e decidiu voar.
Termino com um apelo:
Por favor, devolvam-nos os Trilhos dos Abutres!


